segunda-feira, 7 de maio de 2012

::: Todas prontas para a micareta?

Estamos em maio né? Estava pensando que logo logo começam as "grandes" comemorações da semana do orgulho gay...


Uma pergunta simples e direta: você tem orgulho exatamente do que?

E essa pergunta cabe muito bem para ser feita aqui, afinal somos citados como um dos guetos mais organizados do meio gay. Mas somos organizados em que? Por que temos uma bandeira própria, baladas exclusivas e por que gostamos de bater no peito para dizer que somos felizes por sermos diferentes? Por que temos uma identidade? Mas é só isso? Não entendo nada disso como organização...
Uma coisa que nunca consegui entender é o seguinte: por que todos que já sofreram preconceito ou exclusão são os primeiros a tomar atitudes com o intuito de segregar também? Negros, orientais e, principalmente, gays!

Não dá para acreditar que temos uma das maiores paradas gays do planeta e simplesmente não conseguimos nos organizar de forma política, pelo simples fato de olharmos para o lado e começar a taxar outro gay com um monte de rótulos que segregam ou limitam a pessoa a ser somente aquilo... caminhoneiras, travecas, pintosas, barbies, ursos... enfim, todo dia ouço uma nova classificação para gays e lésbicas que apenas separam as pessoas em grupos, mas não permite que nos vejamos pela nossa definição: pessoas que sentem atração pelo mesmo sexo.
E esse texto todo não tem nada haver com a palavra tesão... você pode ter tesão na maçaneta da sua porta e isso é um problema seu e do seu psicólogo.

A questão é por que a maior manifestação gay do país virou a maior micareta a céu aberto e esqueceu totalmente o significado político que uma manifestação deste tipo precisa ter. Aliás, talvez 30% dos homossexuais presentes não saibam de fato por que existe a parada LGBT.

Foto: divulgação - Foto de 2004 quando ocupávamos só uma lado da Av.Paulista e tudo era mais "organizado" e "politico"


Faça uma reflexão: você tem orgulho do que? Que você pode agora se unir ao seu companheiro em uma união estável e podem até ser dependentes no convênio médico? Que grande bosta, meu amigo! Isso sempre foi nosso por direito, não somos diferentes de nenhum hétero que paga seus impostos e elegem essa corja que fica tirando sarro da nossa cara em Brasília. Que bom que você agora pode se unir com seu companheiro, mas só tome cuidado para não sair na rua de mãos dadas e apanhar com uma lâmpada na cara. E se acontecer isso e você sair vivo, agradeça ao seu Deus, ou seja lá o que for que você acredita, pois muitos não estão aqui hoje para comemorar a próxima micareta. Afinal o Brasil está muito bem posicionado em primeiro lugar no ranking de países que mais têm crimes por Homofobia , estima-se que no Brasil morra uma pessoa LGBT a cada 24 horas pelo simples fato de não ser heterossexual. Como cidadãos brasileiros pagadores de impostos, é uma vergonha que isso ainda aconteça.

Sem contar que ainda temos aquela beleza de bancada evangélica fundamentalista para incentivar que sejamos vistos como freaks, nos demonizando, nos tratando como pessoas
como problemas psiquiátricos ou espirituais fazendo assim com que um direito básico continue nos sendo negado.

Essa reflexão me veio hoje na faculdade (faço publicidade) e estamos fazendo um projeto experimental, montando uma campanha publicitária como se fosse real, com todo planejamento, pesquisas e blá blá blá. Nosso cliente é uma marca de rações para cães. Temos que trabalhar o público alvo de mulheres acima dos 30 anos e da classe AB. Durante a orientação questionei minha professora qual o motivo das marcas ainda terem resistência para direcionar campanhas para o público gay, uma vez que a gente consome até mais que os héteros que têm filhos e esposas para sustentar. A resposta já era esperada: muitas empresas não fazem isso para não associarem sua imagem ao público gay e acabar desagradando a grande fatia de hetéros consumidores. Afinal qual hétero compra um produto que assume um posicionamento que também pode ser consumido por gays? Mesmo que isso seja óbvio, pois compramos as mesmas marcas de cigarro, os mesmos desodorantes e comemos nos mesmos restaurantes.

Então veio o seguinte insight: e se resolvêssemos nos organizar e boicotar as marcas que não são friendly... ou pior, encher o rabo de dinheiro da marca concorrente que tem uma postura mais amigável com os homossexuais? Não sei o quanto você entende sobre consumo e o quanto isso afeta a economia do país, mas mesmo que você não tenha o conhecimento histórico ou econômico a respeito, vou fazer uma observação simples e facilmente digerível... foi o "consumo" que transformou os Estados Unidos na maior potência mundial desde os anos 50 para cá. E mesmo que eles andem mal das pernas financeiramente, a mensagem produzida pelo país continua sendo massificada para o planeta inteiro, as pessoas continuam ingerindo doses cavalares da cultura americana no seu dia-a-dia. Tudo por que eles ensinaram o mundo a consumir e nos disseram o que deve ser consumido. Trazendo isso para nossa realidade: se os milhões que batem cabelo na parada gay todo ano resolverem privilegiar algumas marcas por terem uma postura mais tolerante, isso iria gerar uma grande revolução no consumo deste país. Nenhuma marca quer perder uma fatia de milhões de consumidores para uma concorrente. Somos 10% do total consumidor no país que consomem muito bem, geralmente gastamos somente com nossas necessidades, afinal, como dito anteriormente, não temos filhos e esposas, e procuramos sempre os melhores produtos - de primeira linha ou de melhor qualidade. Pense nisso!

Bem, essa é a parte simples do negócio e agora quero retomar a ideia do inicio do texto. Não dá para sentir um orgulho gay em um país que meus direitos básicos como cidadão, indiferente da minha orientação sexual, são negados por conta de uma particularidade que não influencia em nada no pagamento dos meus impostos e no meu papel na sociedade. Por que continuamos aceitando isso?

Eu tenho uma possível resposta: nosso preconceito! É ele que nos barra de entender que estamos no mesmo barco da traveca, da pintosa, da caminhoneira, da barbie... e vice-versa, o preconceito não é um mal apenas dos bears, mas de todos os gays que se preocupam mais em apontar o dedo ao invés de dar as mãos e pensarmos juntos como um grupo sem rótulos.

Há algumas semanas vi um post numa rede social que me deixou literalmente passado. Um post de um vídeo de um gay franzino cheio de trejeitos falando do seu amor pela Gaga, Britney ou qualquer uma dessas divas descartáveis acompanhado de uma série de comentários agressivos com menções do tipo "esse merece apanhar na rua". Oi? Não entendi. Fiz questão de comentar que discordava, que ninguém, seja hetero ou gay, merece passar por qualquer tipo de violência por ser como é. O mais incompreensível é que tanto o post original quanto os comentários eram todos de gays. Como assim? Acredito sinceramente que o post foi apenas uma forma de compartilhar algo engraçado como fazemos diariamente nas redes e que os comentários foram apenas infelizes pois não tem uma pessoa que não se comova quando vê a cara desses jovens todas arrebentadas na TV e no Jornal, ou não sinta uma grande tristeza quando esses jovens vêm a óbito. Não relato isso apenas para criticar a atitude, mas para te fazer pensar se você também não age assim no seu dia-a-dia. Se o seu preconceito também não te faz falar coisas que realmente não é o que você realmente gostaria que acontecesse. Temos o hábito de usar a frase "fulano merece apanhar"... será que é isso mesmo que queremos? Que alguém passe por uma violência na mão de alguém cheio de ódio? Que vejamos a família da pessoa passar por essa violência que atinge a todos eles, não somente o agredido?



Foto: divulgação // Parada em 2011 - Melhor não comentar



No dia que abandonarmos esses preconceitos idiotas e compreender, por exemplo, que temos que fazer como os evangélicos e votar somente em candidatos que vão lutar pelos nossos interesses, talvez possamos nos chamar de organizados. Os gays só não conseguiram assegurar mais direitos até hoje por que acham que vestir couro, carregar a bandeira bear, ficar sem camisa exibindo o tanquinho, ficar exibindo a nova prótese de silicone nos peitos ou ficar de óculos escuro enchendo a cara a céu aberto é o suficiente para comunicar quem são e que pelo número de participantes teremos automaticamente o respeito daqueles que nos governam. A dita Parada Gay é um evento que hoje reúne héteros, gays, bissexuais e trans coexistindo em uma festa, supostamente sem preconceitos e supostamente de forma pacífica, Porém estamos falando de um dia... nos outros 365 precisamos trabalhar, estudar, comer, beber, sair na rua diariamente como qualquer outra pessoa – mas em segurança e tendo nossos direitos como cidadãos garantidos.

Estamos falhando vergonhosamente no critério orgulho, pois não conquistamos nada além do que já deveria ser nosso e ainda temos muito que ainda está sendo negado.

Precisamos entender o significado da palavra organização e devemos banir de dentro de nós o preconceito que tanto lutamos para acabar fora do nosso grupo. Não se esqueçam que a faxina sempre deve começar no fundo do quintal para chegar até a calçada, ou seja, antes de exigirmos respeito, devemos respeitar aqueles que são iguais a nós.

Em ano de eleição, pense bem para não jogar seu voto no lixo.

Acorda bicharada, você tem um único dia para protestar no ano junto com as irmãs!

Não envergonhe a classe!

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